26/09/08 (Sexta) – Porto Alegre / São Paulo – 1140km






















O hotel era legal, mas ao abrir a janela do quarto, pela manhã, tivemos certeza que estávamos no Brasil. Você pode até estar num bairro rico, mas é muito provável que tenha uma favela, um cortiço ou algo do tipo ao alcance da sua vista. Outra cena típica do Brasil também, aconteceu quando paramos para pedir informação num ponto de táxi, veio um vozinho na janela do carro, cuspindo a dentadura em cima do Pablo..rs..coitado (do Pablo!) e ele queria de qualquer jeito entrar no carro para nos mostrar o caminho até pegar a estrada, só faltava essa agora, só se ele fosse no meu colo, porque não cabia nem um cisco mais dentro do carro! Quando a gente disse que não interessava, o velho ficou bravo, resmungando e deu uma informação errada, claro! Também é muito típico dos brasileiros querererem levar vantagem em tudo, agora, até cobram por uma informação. Tínhamos decidido ir pelo litoral, a distância era praticamente a mesma, queríamos evitar as Serras da 116 e manter a proposta de fazer toda a volta da viagem pelo litoral, desde Ushuaia. O que a gente não imaginava é que o tempo estaria horrível, muuuuita chuva, tudo cinza, escuro, foi um saco. Não conseguimos parar em nenhuma praia, e nem conhecer Torres que ficou faltando na viagem do ano passado. A BR 290 estava muito ruim, toda esburacada e em obras. Eu, o tempo todo pedia o carro para o Nano, pois (como algumas pessoas vão lembrar...rs) eu tinha 3 condições para aceitar ir direto para São Paulo: “Eu não dirijo à noite, eu não dirijo com chuva, eu não dirijo na Régis”. O Nano não aceitava dormir em Curitiba de jeito nenhum, estava desesperado pra chegar em casa, beleza, desde que as minhas 3 condições fossem respeitadas, eu fazia o que ele quisesse. Bom, na 290 ele não queria que eu dirigisse por causa dos caminhões e das péssimas condições, tudo bem, estava ruim mesmo. Na 101, ele ficou esperando parar a chuva, que não parava nunca. Isso não ia dar certo, uma hora ele ia se cansar, mesmo que demorasse, esse era meu medo, afinal, “eu não dirijo na Régis, não dirijo com chuva e não dirijo à noite” e a ordem dos fatores não altera o produto. Então eu mudei de tática e comecei insistir para dormirmos em Curitiba. Ano passado tinha sido um pesadelo dirigir na Régis, levamos sete horas para ir de SP à Curitiba! Isso porque era de dia e estávamos descendo! As crateras eram gigantes, vimos pelo menos meia dúzia de caminhões tombados em 400 e poucos km, fora a infinidade de pneus estourados no meio da pista, enfim, pegar a Régis à noite era insanidade e ele não podia contar comigo, afinal, “eu não dirijo na...”, não sei quantas milhões de vezes repeti isso, mas eu devia lembrar que ele nunca presta atenção no que eu falo. Já á tarde, almoçamos num posto, um belo x-salada que mais parecia um x-tudo, igualzinho os da Argentina. Aproveitamos para comprar um queijos típicos...que bom estar no Brasil. Paramos em Florianópolis no final da tarde e quando saímos do posto, aconteceu o que eu temia, o jiraia se cansou e me disse “Você pode ir um pouquinho?”. Puxa, justo agora que estava começando a ficar de noite, entre dirigir na chuva e dirigir à noite, eu preferia ter dirigido o dia inteiro na chuva. Mas a promessa era que seria “só um pouquinho” até o joelho parar de doer, que, por sinal, destruiu durante a viagem. Eu peguei todo o lusco-fusco, que eu odeio! Fiquei com dó do Nano e seu joelho podre e resolvi ir até onde eu conseguisse, não até onde eu enxergasse, porque já era noite e eu não enxergava nada mesmo! Minha meta era Curitiba, se eu não o convencesse de dormirmos lá, eu entregaria o carro e a bucha era dele, pois “eu não dirijo na...”. Quando vi que estávamos perto de Curitiba, parei num posto para tomarmos um café e claro, entregar o carro. Mas ele veio com uma estorinha de “você continua mais um pouco?” Que raiva. Na saída do posto ele ainda veio me dizer o que fazer, por onde ir e tal, eu já estava p..., foi fácil começar uma discussão. Ele me mandou parar, que ele ia, putz, era tudo que eu queria, puxei o freio de mão e saí do carro. Logo depois começou o maior temporal, já era bem noite, eu com a maior dor de cabeça e ele nem pra dizer “ainda bem que você não veio”, estava era com raiva de mim, problema dele né?...Que nada, o problema foi todo meu. Uns 50 km depois ele entra num posto, encosta o carro num canto, abaixa seu banco, se ajeita e diz: “vou descansar um pouco”, juro, assim. Eu e o Pablo com a maior cara de interrogação. Era meia noite, o Pablo baixou a cabeça pra tentar tirar um cochilo, eu estava morrendo de sono, mas meu sangue estava fervendo, eu não tinha nem onde me ajeitar, só o “bonito” conseguia abaixar o banco. Eu saí do carro muito p..., comecei a chutar pedras na frente do carro e falar um monte, não dava pra acreditar que não tínhamos ficado em Curitiba e agora eu ia ter que passar a noite, ou boa parte dela que nem uma vela dura e em pé, naquele posto xexelento, porque o “bonito” precisava descansar! Fala sério. O Pablo, como é muito da turma do bem, quando percebeu que a coisa ia engrossar, saiu de fininho, foi lá do outro lado ver o movimento da estrada. Eu perdi completamente a paciência, xingava, gritava, e o “bonito” ajeitadinho no banco, nem se mexia...eu adoro isso. Abri a porta do carro, tentei xingar bem de pertinho pra ver se surtia efeito, nada, ele nem aí, mas disse para irmos embora, “ta, não vou mais descansar”...E eu ia confiar minha vida àquela cara toda de sono? Não dava. Sentei numas pedras e continuei falando um monte, decidi que, ou eu ia dirigindo (como?), ou ele dormia ali até de manhã, só 10 minutos não resolvia. Uns 15 minutos depois ele abre a porta do carro, quase despencando, a cara amassada e fala “ta, vamos embora, você vai dirigindo”...Achei que ia ter um enfarto de tanta raiva, saí cantando pneu, sem querer né, eu nem sabia quem estava dirigindo, eu é que não era. Pedi pra Deus me tirar do meu corpo e ele mesmo sentar ali e dirigir, porque “ERA NOITE, ESTAVA CHOVENDO MUITO E ESTÁVAMOS NA RÉGIS”. Na Serra, parecia surreal, muita água, muita neblina, muito escuro, muitos, muitos caminhões! Eu, sozinha, quis ter só pra mim, astigmatismo, miopia e hipermetropia, me fala se dá pra dirigir nessas condições, ceguinha desse jeito. O mais surreal de tudo foi depois de uns 20 minutos ver alguém “roncando” do meu lado, como ele conseguia?! Diz ele que tem muita confiança em mim, sei. O Pablo, agora no banco de trás, devia estar em vigília..rs...se não era, ficou religioso nessa noite. Eu não sei como, às 04:00hs do dia 27/09 fomos “arremessados” em Embu, eu já tinha perdido o rodoanel e não fazia a menor idéia de onde estava, quem eu era, enfim...àquilo tudo estava com cara de cidade..hehe. Parei o carro num farol, o “bonito” acordou assustado e eu entreguei o carro, estávamos em São Paulo, depois de termos ido até o fim do mundo de carro, pra mim não dava mais, já tinha ido além do meu limite. Foi exatamente assim que terminanos nossa aventura...Nós tínhamos ido mesmo? Certeza?! Chegamos em casa e a sensação era como se não tivéssemos saído daqui, parecia um sonho, não tinha caído a ficha ainda.